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O TREM EM CANELA - Uma Jornada Histórica

Atualizado: há 2 horas

Os principais marcos da história ferroviária mundial, brasileira e regional, destacando como o trem influenciou diretamente o desenvolvimento do Rio Grande do Sul e da cidade de Canela.


O Mundo Descobre o Trem (1822–1830)

Mais que trilhos, uma revolução que mudou paisagens e destinos.


Dia 23 de junho de 1822, na Inglaterra


George Stephenson fundou a primeira empresa para construir locomotivas e ficou encarregado do projeto para a construção da primeira linha férrea utilizando locomotivas, dispensando completamente o uso de cavalos.


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Em 1825, a locomotiva Locomotion percorreu 51 quilômetros com 600 passageiros e 60 toneladas de carga, consagrando-se como o novo meio de transporte.


Na França, o primeiro trem circulou em 1830. Na Alemanha, a primeira estrada de ferro foi inaugurada em 1835.


Curiosidade

No Brasil, as pessoas comentavam admiradas: “É o fim do mundo... onde já se viu, lá na Inglaterra tem uma máquina que anda com um fogo aceso puxando pessoas”.


O Brasil entra nos trilhos

Apesar das lutas internas que entravavam o progresso e das condições econômicas precárias, o Brasil deu um salto modernista em 31 de outubro de 1835. Nesta data o Regente Padre Diogo Antônio Feijó assinou um decreto autorizando a construção de estradas de ferro ligando o Rio de Janeiro com as principais capitais do País.


A Primeira Estrada de Ferro

Mesmo com o decreto assinado, foi apenas em junho de 1852 que surgiu a lei que concedia garantia de juros aos capitais empregados, como era hábito na Inglaterra. Assim, Irineu Evangelista de Souza, o Barão de Mauá, dono da maior casa bancária do Brasil, homem empreendedor e visionário, arriscando seu próprio capital, obteve do Governo da Província do Rio de Janeiro a concessão para a construção de uma estrada de ferro. Ele fundou a Imperial Companhia de Navegação e Estrada de Ferro de Petrópolis, logo depois rebatizada de E.F. Mauá, cujo primeiro trecho foi inaugurado com a presença de Suas Majestades Imperiais em 30 de abril de 1854.


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Curiosidade

A Primeira Locomotiva do Brasil


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A primeira locomotiva usada no Brasil, a de matrícula N° 1, foi apelidada de “Baroneza” em homenagem a esposa de Mauá. Esse exemplar está bem conservado e encontra-se no Museu do Trem do Rio de Janeiro. Foi fabricada na Inglaterra em 1852 por William Fairbain & Sons.



Expansão Nacional (1858–1860)

Trilhos cruzam o Brasil, conectando sonhos e cidades

  • Em fevereiro de 1858 foi inaugurada a segunda ferrovia, a Recife and São Francisco Railway Company, e em 29 de março veio a terceira, a Companhia Estrada de ferro D. Pedro II, chamada depois de Estrada de Ferro Central do Brasil.


  • Em 1860, a Bahia and São Francisco Railway Company iniciou operações.


  • Apesar de brasileiras, as ferrovias recebiam nomes em inglês, pois a tecnologia vinha da Inglaterra.


O Rio Grande do Sul se conecta através dos trilhos (1866–1871)


O único meio de transporte que havia até então para escoar a produção da colônia germânica para Porto Alegre eram as embarcações que navegavam pelo Rio dos Sinos. Com o aumento da demanda, começam a surgir as primeiras discussões sobre a construção da ferrovia que ligaria a capital da província à crescente colônia alemã.


Foram essas discussões que fizeram com que em 1866 fosse aberta a concorrência pública para a construção da estrada de ferro ligando a capital da província do Rio Grande, passando por São Leopoldo até Hamburgo-Berg.


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Os termos do contrato deixavam claras certas normas a serem seguidas, como por exemplo, a proibição do trabalho escravo.


No dia 27 de agosto de 1869, a Assembleia decretou a lei 685, aprovando o contrato entre John Mac Ginity, este representante dos britânicos, e o governo, para a construção da via férrea.


Ao conseguir a concessão da construção da estrada de ferro de Porto Alegre-Novo Hamburgo em 1871, Mac Ginity seguiu para Londres, onde formou uma companhia com o auxílio dos mais renomados engenheiros ingleses da época.


Essa ferrovia, no entanto, foi concluída por Bevan Schmith e por Watson, em 1875, em virtude da enfermidade e morte de John Mac Ginity.



Histórias do Trem


1871


No dia 26 de novembro de 1871,o início das obras da ferrovia em São Leopoldo foi um acontecimento tão importante para a época que tomou grandes proporções. O registro de um narrador inglês - encontrado no livro Estrada de Ferro, de Germano Oscar Moehlecke - conta fatos curiosos:

“Ontem o vapor trouxe inúmeras pessoas da capital, que tiveram alguma dificuldade em encontrar quartos para passarem a noite e vários comerciantes e outras pessoas de Porto Alegre aproveitaram o lindo luar para fazer a viagem a cavalo, uma excursão de quatro horas [...]
Já ao amanhecer podiam–se ver os alemães e os nativos chegarem a cavalo das colônias vizinhas, enquanto o sino da igreja chamava para a missa e o pessoal da estrada de ferro apressava-se em fazer os últimos preparativos para as festas.
A igreja está decorada com bom gosto, com grinaldas de sempre vivas penduradas entre a nave e o santuário e ao redor do altar-mor. Os habitantes estão todos com roupas de domingo, e numerosos fazendeiros estão montados em cavalos cheios de vigor, ostentando ponchos brancos e pesadas esporas de prata [...]
O interior da estação está arrumado como um salão de banquete, com quatro mesas com 160 talheres [...]”

1872


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O engenheiro José Ewbank da Câmara apresentou ao governo imperial um projeto geral para a construção de uma rede ferroviária onde quatro linhas deveriam atravessar a província do Rio Grande do Sul, interligando-a de norte a sul e de leste a oeste, satisfazendo as necessidades estratégicas, políticas e econômicas da região sul e do Império.



A Primeira Ferrovia Gaúcha (1874–1876)


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Em abril de 1874, foi inaugurada a primeira ferrovia do Rio Grande do Sul, ligando a Capital a São Leopoldo por um trecho de aproximadamente 34 quilômetros. Atualmente, o mesmo caminho é percorrido pelo metrô de Porto Alegre. Cerca de 3.000 pessoas compareceram à inauguração, principalmente alemães.


O presidente da província, João Pedro Carvalho de Moraes, faz seu discurso relatando a importância da obra para a província e todos que dela irão se beneficiar, deixando claro que uma nova era iniciaria agora para o desenvolvimento das comunidades, e por consequência, do estado.


Curiosidade

Todo material usado na Estação de São Leopoldo foi importado da Inglaterra, inclusive os trilhos. A Estação de São Leopoldo veio pré-montada, sem pregos e nem parafusos, e ao chegar foi montada toda por encaixe.


"Por fora era toda de zinco, pois temiam que acontecesse como nos Estados Unidos, onde os índios tocavam flechas incendiárias e queimavam as estações de madeira. Obviamente isso não aconteceria no Brasil, onde os índios não tinham esse costume, mas os ingleses tomaram suas precauções."


O primeiro trecho da ferrovia tinha uma extensão de 33.756 metros e quatro estações, sendo elas: Porto Alegre, Canoas, Sapucaia e São Leopoldo, e em 1876 a estação de Hambugo-Berg, tornando-se realidade a primeira ferrovia do Rio Grande do Sul.


O trem que ligava a capital da província à colônia alemã provocou inúmeras mudanças, encurtou distâncias, alterou a paisagem, fez com que novos povoados nascessem, mudou o quadro do comércio e da produção agrícola, acelerando ambas. Contribuiu também para o fenômeno típico do Rio Grande do Sul, a dispersão do colono alemão para o interior do Estado, onde este buscava terras novas para plantar, já que a disponibilidade era maior.


Outra estação idêntica a de São Leopoldo, foi montada em Porto Alegre pela mesma companhia inglesa chamada The Porto Alegre and New Hamburg Brasilian Railway Company Limited, construtora da primeira linha férrea do Rio Grande do Sul, onde João Corrêa trabalhou como mestre ferreiro.


A estação de São Leopoldo foi reconstruída de acordo com um levantamento fotográfico e abriga o Museu do Trem.


 

Impactos e Transformações

O trem não só transportava pessoas — ele levava progresso

A ferrovia encurtou distâncias, acelerou o comércio e a produção agrícola. Surgiram novos povoados e houve dispersão dos colonos alemães para o interior do estado. A paisagem e a dinâmica social do Rio Grande do Sul foram profundamente transformadas.

 

A chegada do trem ao estado foi um marco de transformação. Canela, como parte desse processo, carrega em seus trilhos a memória de um tempo em que o progresso vinha com vapor e esperança.



João Corrêa e o trem


Foi mais ou menos pelo ano de 1880, quando estava com 17 anos, que João Corrêa Ferreira da Silva se tomou de amores pelos trens. Ingressou nas oficinas da Estrada de Ferro de Porto Alegre/Novo Hamburgo – The Porto Alegre & New Hamburg Brazilian Railway Company onde aprendeu muito e se destacou no ofício. Mas ficou por pouco tempo. 


Aos 18 anos, casou-se com Maria Luiza Frederica Burmeister e decidiu empreender seu próprio negócio. Nessa época ele já alimentava a ideia de fazer ferrovias, mas foi a cavalo mesmo que um dia subiu a serra e conheceu o Campestre Canella, terra pela qual se apaixonaria embora sendo ainda tão jovem não podia imaginar o que o futuro lhe reservava.


Em 1899, ganha a concorrência para a construção do ramal ferroviário de Novo Hamburgo à Taquara, dando o primeiro passo para realizar um dos seus sonhos, que era o de fazer o trem vencer as montanhas e chegar a Canela.


O decreto n° 262, de 18 de dezembro de 1899, assinado por Borges de Medeiros, concede a João Corrêa & Irmão e a Augusto Carlos Legendre direito à construção e uso de um Tramway a vapor entre Novo Hamburgo e a Vila de Taquara do Novo Mundo. A construção começou em 1901.


Um novo século começa e João Corrêa compra o Campestre Canella

Por muitos anos, João Corrêa dedicou-se a muitos ofícios, empreitou estradas de rodagem, estradas de ferro e pontes. Mas foi só em 28 de março de 1903, aproximadamente 20 anos depois de ter conhecido e se apaixonado pelos campos e matas da região, que comprou do Capitão Felisberto Soares de Oliveira uma área de 19.862.950 m² do Campestre Canella. Em seguida, construiu uma série de rodovias, entre as quais a rodovia até suas terras.


Mais uma vitória de João Corrêa: em 15 de agosto do mesmo ano foi inaugurada a linha férrea de Novo Hamburgo à Taquara com 8 estações ferroviárias, sendo elas: Novo Hamburgo, Hamburgo–Berg, Campo Bom, Sapiranga, Nova Palmeira, Campo Vicente, Parobé e Taquara do Novo Mundo.


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Curiosidade


Maria Fumaça

As locomotivas a vapor eram chamadas de Maria Fumaça. Havia de todos os tamanhos para os diferentes percursos e quantidade de vagões que tinham que puxar. Como era movida a lenha, muitas árvores precisavam ser cortadas e queimadas numa caldeira que produzia vapor, atingindo uma velocidade aproximada de 45 km/h.


O foguista era quem alimentava a caldeira durante toda a viagem, enquanto o maquinista conduzia o trem. Cada nova estação de trem que surgia era um novo povoado que se desenvolvia.


1905


O engenheiro João Antônio Ryff, representante do governo provincial e responsável pela fiscalização da obra da Estrada Novo Hamburgo à Taquara, relata em 1905 sobre as mudanças ocorridas na região em função do funcionamento da ferrovia:

“Há menos de dois anos que foi inaugurada esta via férrea, e o traçado por motivos técnicos, nem sempre foi procurar os centros povoados, afastando–se da antiga estrada de rodagem, colocando as estações e paradas em campos e matos sem casas nas suas imediações, pois, neste curto lapso de tempo vê-se agrupamentos de casas ao redor das estações, depósitos para gêneros coloniais, armazéns, vendas, etc. As estações de Campo Bom, de Sapiranga, de Parobé e de Taquara, apresentam um grupo pitoresco de dezenas de casas novas. Mas não é só ao redor das estações que se nota progresso; a atividade se estende sobre as terras de lado da via férrea onde se vê ranchos e terras lavradas.”

1908


Cinco anos depois, finalmente João Corrêa consegue comprar de Ignácio Saturnino de Moraes as terras que faltavam para realizar seu sonho: 18.968.000 m². Com essa quantidade tornou-se praticamente o dono do Campestre Canella.


1912


O sonho do trem toma forma

Quando a casa da família Corrêa começou a ser construída em Canela, João e seu filho Janguta começaram a planejar a linha férrea que uniria Taquara a Canela. A firma João Corrêa & Filhos vendeu, por 100 contos de réis, 20 colônias de pinhais à Companhia Florestal, para levantar fundos para a construção da via que, dois anos depois, em 1914, inaugurou o trecho Taquara-Sander.


Mas a Guerra chegou e as obras só foram retomadas em 1916.


Trem de carga

Antes da conclusão do ramal que se prolongaria até Canela, o trem de carga trazia de Porto Alegre as encomendas para os caixeiros-viajantes que faziam as vendas nos armazéns da colônia. Os pedidos chegavam de trem até a Estação de Sander, e os compradores vinham das cidades vizinhas em carretas para buscá-los. De Sander para Porto Alegre eram enviadas as mercadorias produzidas na zona rural, como suínos e feijão, e, de Canela, a madeira dos pinheiros.


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1913


Aumentam as serrarias no Caracol


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O primeiro sinal de desenvolvimento turístico de Canela ocorreu no Caracol, local de ambiente muito calmo, habitado por aproximadamente 350 pessoas, a maioria delas descendentes de Guilherme Wasem.



A tranquilidade do local passou a ser substituída pelo movimento de pessoas que compravam terras da família Wasem, e pela implantação da Companhia Florestal, que, entre 1913 e 1914, abriu estradas e instalou cinco serrarias para a extração de madeira da região. Com isso, a localidade passa a contar também com novos moradores, como Pedro Franzen, que já estivera no Caracol em 1903 juntamente com João Corrêa visitando a região, ocasião em que este sugeriu a ele que instalasse sua serraria no Caracol:

“(...) pois é um lugar onde tem grandes pinheirais e pretendo trazer o trem até aqui e promover o desenvolvimento.”

Franzen se animou e comprou cinco mil hectares de terras, prevendo a possibilidade de prosperar e fixar residência ali com sua família.


Enquanto isso...

No centro de Canela, João Corrêa e sua esposa Luiza constroem sua residência no local onde mais tarde abririam o Grande Hotel Canela.


1916


Na Serra Gaúcha, apesar da guerra, todos festejavam a inauguração da Estação de Trem que ligava Taquara a Sander, facilitando a chegada de turistas para veranear nas pensões e pequenos hotéis que surgiam em volta do Caracol.


Vislumbrava-se também uma nova fonte de renda, não só pela beleza da cascata, mas também pelo clima ameno do verão e pelo frio do inverno. A precipitação de neve fez com que inúmeras pessoas subissem a serra, principalmente os alemães, para matar a saudade de sua terra natal.


Curiosidade


Contam que, na região de Sander, o apito do trem funcionava como relógio: quando o trem passava por ali, perto das 11 da manhã, todos sabiam que era hora de deixar o trabalho na lavoura e voltar para casa para o almoço.


Sobre o nome da estação de Sander, os moradores mais antigos contam um fato engraçado: quando a ferrovia chegou e construíram a estação, havia três coqueiros perto do local, então colocaram uma placa que dizia: “Estação Três Coqueiros”. Mas alguém cortou um coqueiro durante a noite, e no dia seguinte só havia dois coqueiros; então, novamente, mudaram o nome para “Estação Dois Coqueiros”. Quando desapareceu o segundo coqueiro na noite seguinte, mudaram o nome para “Estação Sander”, provavelmente por ser o nome do dono do terreno, que gostaria de se ver homenageado na estação.”


A gripe espanhola

A pandemia que aconteceu entre 1918 e 1920 atingiu todos os continentes e deixou um saldo de, no mínimo, 50 milhões de mortos, entre os quais o quinto presidente do Brasil, Rodrigues Alves. Suas origens poderiam estar ligadas à queda de padrões sanitários e aos efeitos da escassez alimentar decorrentes da 1ª Guerra Mundial.


O Trem vem chegando


João Corrêa e seus filhos conseguiram fazer o trem chegar a Várzea Grande, atual bairro de Gramado. Mas, nesse ponto, surgiu um grande problema: a subida da montanha era um desafio que os mais renomados engenheiros não acreditavam ser possível transpor.


Mas João, para quem nada parecia impossível, não desistiria, mesmo que, para tanto, esgotasse seus recursos e sua saúde. Já havia superado 615 metros de altitude; faltavam apenas 215 metros e 17 quilômetros de distância para chegar ao destino escolhido. O Coronel João Corrêa não desistiu e teve uma ideia inédita: o Rabicho!


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O Rabicho era um trecho muito emocionante da viagem. Havia uma subida tão íngreme a ser vencida que a marcha do trem precisava ser invertida para poder subir. Quando chegava à Várzea Grande, as pessoas desciam do trem e por uns 15 minutos podiam refrescar-se e lanchar em um armazém com vinhos, queijos, salames e doces que ficava próximo. O trem, por sua vez, subia uma rampa de marcha à ré para pegar força. Depois que passava esse pedaço tenebroso, as pessoas voltavam a subir no trem e seguiam viagem. Esse lugar foi restaurado e pode ser visitado na Várzea Grande, em Gramado.

 

Quando João Corrêa, aceitou que o governo encampasse a linha férrea por menos do que valia, pronunciou a célebre frase que de certa forma o imortalizaria:

“Meu desejo é não ficar devendo um vintém a quem quer que seja. Pagarei até o último níquel. A minha glória e a de meus filhos é a de termos vencido a subida da montanha, arrostado sacrifícios penosos e até a fome. A estrada ficará aí para exemplos dos que tiveram que repetir esta façanha. Nada mais queremos. Canela será a Petrópolis do Rio Grande do Sul e verão, os homens de amanhã, se fomos uns utopistas ou se revelamos ao Rio Grande um dos mais belos e futuros recantos de seu território”

O Álbum do Trem

O Correio do Povo do dia 11 de julho de 1919 publicou uma notícia sobre “um interessante álbum confeccionado pela agência Kosmos contendo 84 fotos tiradas com muita nitidez mostrando os vários aspectos da construção da via férrea Taquara a Canella”, de propriedade do Sr. João Corrêa e Filhos.


Esse álbum existe em perfeito estado de conservação e pertence ao acervo do Grande Hotel Canela, veja algumas de suas fotos:



Curiosidade

As empresas que vendiam e financiavam as locomotivas eram empresas estrangeiras então era necessário constituir álbuns para comprovar no exterior as realizações efetivas à medida que as obras avançavam. As pontes eram chamadas de obras de arte e os trechos mais expressivos eram especialmente fotografados.


Anos 20

Com a chegada do trem, primeiro em Sander em 1914 e mais tarde em Canela em 1924, vieram os veranistas, famílias residentes na capital ou nas cidades próximas que recebiam de seus médicos a indicação para subir a serra em busca de ar puro e descanso, principalmente aqueles que sofriam de doenças pulmonares. Muitos gostavam tanto do lugar que compravam lotes e permaneciam definitivamente.


Por volta de 1926, Canela já tinha se transformado em um ótimo lugar para os negócios e, em março desse mesmo ano, o território foi elevado à importante condição de Distrito de Taquara. Surgiram estabelecimentos comerciais, pequenas indústrias, a população aumentou e surgiram novas pensões para acomodar a mão de obra e os turistas, que chegavam em número cada vez maior.

 

O trem chegou até Gramado (1921)


Depois da chegada à Várzea, tendo adquirido novo empréstimo, João Corrêa constrói mais 10 quilômetros de estrada de ferro, chegando a Gramado no dia 9 de abril de 1921. Mas os recursos financeiros para fazê-lo chegar a Canela se esgotaram.


O Estado encampou o trecho que já existia, pagando uma miséria a João e seus filhos, e não tomou nenhuma iniciativa para seguir até Canela, onde a Estação já estava pronta e, no trecho, tudo preparado para receber os trilhos. Com a chegada do trem em 1921, Gramado e a região ganharam novo impulso econômico, já que agora não era mais necessário se deslocar até lugares mais distantes, como Sander, Igrejinha ou Taquara, para despachar os produtos coloniais e receber as mercadorias e os veranistas vindos da capital.

 

Curiosidade

Você sabia que as pessoas precisavam vestir guarda-pó para viajar no trem?


Movido a carvão e lenha, o trem espalhava uma densa e negra fumaça. O abastecimento de água era feito através de caixas d’água existentes próximas à ferrovia. Uma fumaça densa e negra saía da chaminé, mas as janelas precisavam ficar abertas porque o calor lá dentro fazia parecer uma sauna.


Para que as pessoas não ficassem com as roupas negras de fuligem, a própria Viação Férrea fornecia guarda-pós aos viajantes. As malas eram forradas com capas de lona para que a fuligem não sujasse as roupas.


Em 1922, o Brasil já contava com 29 mil quilômetros de ferrovias, duas mil locomotivas a vapor e 30 mil vagões. A partir da década de 1920, houve um aumento do investimento em rodovias, que passaram a competir com as ferrovias pelos recursos públicos.


Na passagem do trem as pessoas que trabalhavam nas colônias abandonavam seus afazeres e corriam para acenar com os lenços.


O Trem chega a Canela (1924)


Para concluir a construção da ferrovia, João Corrêa precisou vender nove milhões de metros quadrados dos 30 milhões que possuía. No dia 1° de agosto de 1924, o trecho do ramal ferroviário ligando Taquara a Canela é concluída.


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A locomotiva chegou e, com ela, uma nova era para Canela

Pela primeira vez, a locomotiva a vapor irrompe por entre os pinheirais com seu assobio imponente, emocionando as pessoas do Campestre Canella. A locomotiva que subia a serra não puxava só os vagões, trazia também o progresso e, com sua energia férrea, impulsionava a vocação da cidade que estava destinada a ser um dos mais importantes pontos turísticos do Brasil.


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A Estação Canella é inaugurada em 14 de agosto de 1924, com a presença da comunidade e de autoridades regionais. O apito do trem soava 2 quilômetros antes e, ao chegar, o maquinista tocava o sino, para alegria da população que lotava a plataforma. A chegada do trem deu grande impulso ao desenvolvimento do município. Passar as férias em Canela virou status para os porto-alegrenses.


O trem que vinha a Canela tinha locomotiva e mais quatro vagões: dois para passageiros, um para carregar as malas e outro destinado aos Correios e mantimentos. Também havia o trem que era somente de carga, trazendo de Porto Alegre materiais de construção, areia e outros, e retornando com madeira, farinha de trigo e erva-mate para a capital.


O trem de carga movimentava a economia da cidade, carregando diariamente toneladas de madeira. A madeira era responsável pela prosperidade da região. Saíam de Canela sete vagões por dia, carregados com 60 dúzias de tábuas.


Histórias do tempo do Trem

Muitas histórias são lembradas pelos familiares dos ferroviários

 

A chegada do trem em Canela era sempre uma festa!

As moças e rapazes vestiam seus melhores trajes e, ao ouvir o apito, corriam para a Estação. Sempre havia novidades para ver. A expectativa pela chegada de cartas e encomendas era enorme. De Taquara a Canela, o trem parava em sete estações: Igrejinha, Mundo Novo, Sander, Agente Allan, Maquinista Maura, Várzea Grande e Gramado.


Tinha gente local que pegava o trem só para passear na novidade!


Travessuras na Estação

Uma carta escrita em 9 de dezembro de 1928, pelo agente que cuidava da Estação de Canella, foi endereçada ao subintendente da cidade, Henrique Muxfeldt. Reclamava da permanência de “meninos despreocupados” na plataforma da estação durante a tarde, na hora de chegada do trem de passageiros, praticando algazarras, permanecendo no leito dos trilhos e penetrando nos vagões com o trem em movimento. Em nome da segurança desses menores, o agente solicitava a fineza de mandar destacar um “praça de polícia” todas as tardes, por ocasião da chegada do trem.


Entre as brincadeiras preferidas dos garotos, uma era colocar pedras nos trilhos para vê-las “estourar”, fazendo um barulhão quando a locomotiva passava por cima, e outra era passar sabão nos trilhos para ver o trem patinar.

 

De Lorena Deecken

“Meu pai, Arzelino Veriano da Silva, desempenhava as atividades de mestre de linha, percorrendo diariamente, pela madrugada, o trecho de Igrejinha à Estação de Sander, antes que trafegasse o primeiro trem do dia, para ver se estava tudo em ordem [...] havia pregos que eram colocados nas emendas dos trilhos que poderiam causar acidentes se não fossem retirados a tempo.[...] no inverno, principalmente na serra quando chovia muito, caíam barreiras de terra, cobrindo a ferrovia, e à noite, quando o trem–socorro com aquele apito alertava que algum acidente havia ocorrido, levava nossos pais para um trabalho de limpeza nos trilhos, que levavam semanas ou até meses para retornar para casa.”

De Henriqueta Bezzi Paschoal

Ela relata que, entre as estações Várzea Grande e Maquinista Maura, havia casas dos agentes ferroviários:

“[...] aqui tinha o guarda-chaves que morava bem pertinho da estação [...] Daqui até Maquinista Maura, eram diversas casinhas da Viação Férrea encostadas nos trilhos [...]”

Casou graças ao trem

Estes fatos interessantes marcaram a vida não só dos filhos dos trabalhadores da V.F.R.G.S., mas também das pessoas que dependiam do trem para se locomover de Canela à capital do Estado ou da capital até as cidades servidas pelo ramal ferroviário de Taquara a Canela, como é o caso da irmã da Sra. Henriqueta, que casou com um agente ferroviário que veio substituir as férias de um colega.


Faíscas

“Certa vez nós voltávamos de Porto Alegre para Várzea Grande, e nos pontos mais íngremes começava aquele barulho, a gente via como forçava o trem, e então vinham todas aquelas faíscas e tinha que deixar as janelas fechadas, porque entravam faíscas, fumaça e sujava toda a roupa [...] Uma vez queimei todo o meu vestido [...]”

Bonecos de Neve

Um fato que marcou a vida das pessoas nas localidades servidas pelo trem do ramal ferroviário de Taquara a Canela foi a neve. Quando nevava em Canela, as pessoas faziam bonecos na plataforma do trem como forma de avisar que era necessário se agasalhar bem, como conta o Sr. Nilo, morador até hoje na localidade de Sander:

“[...] o trem de passageiros subia de manhã até Canela, e voltava no outro dia de manhã; muitas vezes eles faziam bonecos de neve em cima do trem [...]”

O Vagão de João Corrêa

Quando João Corrêa ainda era aprendiz de ferreiro da The Porto Alegre and New Hamburg Brazilian Railway Company Limited, consultado pelo diretor da ferrovia, Mr. Tweedie, se seria capaz de fazer as ferragens de um pequeno vagão que seria destinado ao uso privado daquele diretor, respondeu afirmativamente e executou com perfeição.


Trinta e dois anos mais tarde, quando seus filhos já eram seus sócios, descobriram essa história e procuraram localizar o tal vagão, encontrando-o na sucata da V.F.R.G.S., em Santa Maria, onde João nascera. Os filhos compraram o vagão que, posteriormente, depois de reformado, foi usado também no ramal Taquara-Canela.


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Um dia muito especial!

Canela foi elevada à condição de Distrito no dia 2 de março de 1926

A sessão inaugural foi em 14 de março e a cidade passou a ser a sede do Sexto Distrito de Taquara. Quem ocupava o cargo de intendente de Taquara era João Manoel Corrêa, o Janguta, filho de João Corrêa.


Com a influência que exerciam junto ao Partido Republicano de Borges de Medeiros e a alegação que a administração do 5° Distrito, por sua grande extensão territorial e crescente população, pelo grande desenvolvimento comercial e industrial, especialmente nas áreas do Caracol e de outros núcleos coloniais, se tornava penosa para um só subintendente, conseguiram a criação do novo distrito.


Uma reprodução na íntegra do documento encontra-se exposta na recepção do Grande Hotel Canela onde aconteceu a sessão.


O ponto alto do fim de semana era a estação

Às 17h30, ao ouvir o apito e o badalar do sino avisando que o trem se aproximava, a população corria para a estação. Todos queriam chegar antes do trem. A Estação Canella já tinha se tornado um ponto de encontro, como era a missa de domingo e as reuniões dançantes dos hotéis. O trem trazia vida por onde passava.


A estação exercia um fascínio para adultos e crianças. As moças se arrumavam com suas melhores roupas e chegavam em grupos para a estação a espera dos namorados ou de novas paqueras. Os jovens faziam alegres excursões entre Canela e Gramado com música e cantorias. Os trilhos ajudaram também a popularizar o futebol, pois assim como faziam os ingleses, também no Brasil perto de cada estação logo surgia um campo de futebol.


Morre João Corrêa

Em 16 de março de 1928, João Corrêa Ferreira da Silva faleceu em São Leopoldo, vítima de um ataque cardíaco, com apenas 65 anos. O comércio, repartições públicas e bancos foram fechados e o luto declarado.


Em São Leopoldo, foi realizada uma cerimônia em sua homenagem e, em seguida, foi conduzido até a estrada de ferro, seguindo para Canela no trem que fora sua realização em vida. O túmulo de João Corrêa encontra-se no Cemitério de Canela.

 

Anos 30


Getúlio Vargas em Canela


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Getúlio Vargas era presidente do Rio Grande do Sul e fez questão de inaugurar pessoalmente a Usina da Toca, a primeira usina hidrelétrica da região. Partiu de trem com sua numerosa comitiva na manhã do dia 25 de julho de 1930. Dizem que em todas as estações que o trem parava, Getúlio era saudado com entusiasmo e apreço. Numerosos gaúchos montados a cavalo aguardavam desde cedo para prestar homenagem na estação de Canela.


Quando chegou o trem, Vargas foi recebido por autoridades locais e embarcou em um automóvel de luxo, atravessando a cidade com muitos seguidores. Quando passava pelo Canelinha, a comitiva parou e Getúlio foi recebido pelo professor Carlos Wortmann e os alunos da escola com as bandeiras nacional e rio-grandense que prestaram uma homenagem. Dali para a Usina da Toca ainda haviam muitos quilômetros de barro a serem vencidos. Getúlio foi de automóvel até pouco antes do Passo do Inferno, onde Juca Jardim já tinha uma égua encilhada esperando por ele para ir até a usina.


Tudo correu bem, encerrando com um churrasco tipicamente gaúcho e um expressivo discurso de Getúlio Vargas.


Curiosidade

Lei da década de 30 que demonstra a severidade dos costumes vigentes na época.


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Curiosidades sobre o "Rabicho"

Para o carro-motor (automóvel de transporte de passageiros com rodas adaptadas aos trilhos que trazia as pessoas para jogar no cassino), utilizava-se de uma outra engenhosidade: em cada ponta do Rabicho existia um ‘GIRADOR’, que consistia num trilho móvel.


O carro-motor parava sobre o Girador, que girava em 180 graus fazendo com que a viatura ficasse de frente para continuar a subida (ou a descida).


Trens elétricos

Com a escassez de verbas e a fragmentação da malha, aumentavam as dificuldades de gestão das ferrovias nacionais. Mesmo assim, as ferrovias ganharam sobrevida no país, principalmente em virtude do advento da tração elétrica em 1930, em substituição aos trens movidos a vapor, e, posteriormente, em 1939 pela tração diesel-elétrica, que gerou considerável ganho de eficiência.


1933


O batismo da Praça

A praça municipal, que até então se chamava Praça Pinheiro Machado, ganha o nome de Praça João Corrêa, com um busto erguido em homenagem ao fundador da cidade. A placa de bronze possui os dizeres:


A placa de bronze possui os dizeres:

“Ao fundador de Canella, Cel. João Corrêa Ferreira da Silva - Homenagem dos seus amigos e admiradores - 1933”

O sonho do grandioso Cassino

Começa a movimentação para a construção do Cassino Palace Hotel no ponto mais alto da cidade. Concebido pela empresa Sander & Dieterich, o projeto constava da edificação de um grande hotel e cassino, com 12.316 m² em uma área de 37.200 m².


O projeto previa a construção de sete pavimentos — subsolo, térreo, 1º, 2º, 3º e 4º pavimentos, e terraço — ocupados por hall de entrada, salões para o cassino, cinema, jardim de inverno, salões de refeições para adultos e crianças, apartamentos com 138 dormitórios servidos por 80 banheiros, alojamentos para os funcionários, serviços de apoio, dois elevadores, rede de água quente e fria, aquecimento central com radiadores nos quartos e áreas comuns.


Carro a motor para jogar no Cassino

Em proporções menores, um pequeno cassino já funcionava no centro da cidade. Respirava-se o jogo pelas ruas de Canela. Rodas de amigos em bares, nos saguões dos hotéis, Canela estava na mídia do Estado e já atraía muitos jogadores nos finais de semana para a região. Todas as sextas-feiras o carro motor subia a serra com jogadores e retornava no domingo.


1939


O Mundo em Guerra outra vez

Em 1° de setembro, começa a Segunda Guerra Mundial, um conflito militar global que durou de 1939 a 1945, envolvendo a maioria das grandes nações do mundo, incluindo o Brasil.


1940


Todos queriam morar em Canela

No início dos anos 40, a maior parte do centro de Canela já não pertencia mais a João Corrêa e sua esposa. A cidade já tinha mais de mil casas e uma população acima de 7 mil habitantes. Muitas terras, lotes e terrenos foram sendo vendidos para que a cidade se formasse, cumprindo seu destino de estação turística e climática.


Graças ao trem, Canela exportava madeira

Nas exportações, a madeira seguia para Porto Alegre de trem, e de lá, de navio, para países como Uruguai, Argentina, Inglaterra, Alemanha e outros. Canela tinha a Cooperativa dos Madeireiros, com quase a totalidade de madeireiros como sócios.


1945


Canela Emancipada

Numa segunda-feira, 1°de janeiro, acontece a instalação do Município de Canela.

O primeiro prefeito é nomeado por Cordeiro de Farias, Interventor do Estado. Nelson Schneider, um funcionário do Tribunal de Contas do Estado, permaneceu no cargo até 15 de abril do mesmo ano.


O fim da Guerra se aproxima

Dia 30 de abril marca o suicídio do ditador Adolf Hitler, noticiado por todos os jornais do mundo. Após a invasão russa a Berlim e a queda do Bünker, encontrou-se entre os destroços, o corpo do tirano que mudou a história mundial, aniquilando mais de 6 milhões de judeus nos campos de concentração. Com sua morte, o exército nazista e do Eixo perdem força, sinalizando a proximidade do fim da Segunda Guerra.


Luto no mundo

No dia 6 de agosto o luto toma conta do Japão e do mundo com o lançamento das Bombas Atômicas sobre as cidades de Hiroshima e Nagasaki, reduzindo as cidades a cinzas, aniquilando uma população de aproximadamente 320.000 pessoas e deixando terríveis efeitos de radiação.


Fim da Segunda Guerra

No dia 2 de setembro o mundo comemora o fim da Segunda Guerra Mundial!


Após o fim da guerra e a partir de um sentimento generalizado de que era necessário encontrar uma forma de manter a paz entre os países, foi criada a ONU – Organização das Nações Unidas. Seu início foi no dia 24 de outubro, data em que até hoje se comemora o Dia das Nações Unidas.


Em 30 de outubro, Getúlio Vargas é deposto do cargo de presidente do Brasil, através de um golpe militar. Neste mesmo ano ocorrem eleições gerais e Eurico Gaspar Dutra é eleito presidente do Brasil.


1946


Acabou o sonho do Cassino


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Um decreto assinado pelo Presidente Eurico Gaspar Dutra põe fim ao jogo no Brasil e, consequentemente, são interrompidas as obras do Cassino Palace Hotel. A obra não passou da laje do piso térreo. Atualmente as Ruínas do Cassino – como ficou conhecido o local, fazem parte do Patrimônio da Prefeitura e tornaram-se uma atração turística


1960


Quando o ouro verde se esgotou

No início da década de 60, a madeira estava acabando, e com ela acabava também o sonho de muitas famílias que apostaram seu futuro em Canela e passaram a vender o que possuíam para voltar às suas cidades de origem.


O trem, que trazia para a cidade muitos turistas, deixou de fazer o trajeto Porto Alegre - Canela em 1963, pois não havia mais madeira para carregar. As pessoas que subiam a serra optavam pelo transporte de ônibus, e as que tinham melhores condições financeiras usavam seus próprios automóveis. Durante 50 anos, os donos de madeireiras pouco ou nada investiram na cidade, apenas extraíram a riqueza natural das grandes matas de pinheiro, deixando para trás uma terra devastada e estradas totalmente danificadas pelo grande fluxo de carretas e de caminhões usados para o transporte das madeiras.


As famílias passaram a mandar os jovens para estudar na capital ou no Vale dos Sinos. Nesse mesmo período, partindo de algumas lideranças locais, começou um movimento para a retomada do prestígio que a cidade de Canela havia perdido. Alguns eventos sociais e culturais passaram a ser realizados, como o Baile da Garota Turismo, Baile do Suéter, Baile de São João e, ao final de 1961, foi criado o evento chamado Festival da Serra, com programação diversificada que agradava a todos.


1963


Fim da Linha

Em 11 de março de 1963, o trem apitou pela última vez em Canela, deixando a população desolada. O ramal ferroviário fechou e com ele a movimentação de pessoas, de cargas e de mercadorias, e a alegre algazarra que a chegada e a partida do trem ocasionavam, virou tristeza.


O trem se despediu deixando muitas histórias e lembranças. Deixou também um vazio em frente a praça central de Canela, que só voltaria a ter a alegria e o burburinho de pessoas nos eventuais acontecimentos culturais. Ainda teriam de passar 54 anos até que a Estação Canella revivesse novamente.


Estação Férrea restaurada

No ano de 1982, a antiga estação férrea foi restaurada pela administração pública da época e transformada em um centro cultural. O espaço passou a abrigar a Casa do Artesão, local destinado à venda de artigos artesanais feitos por artesãos de uma associação, o Centro de Informações Turísticas e a Secretaria de Turismo, Esportes e Lazer do município.



Mas 31 anos passam e o tempo deteriorou o espaço novamente.

 

2013


A família Bassani desembarca em Canela para mudar o destino da estação


Descendente de italianos do Veneto, Fernando Bassani, advogado por formação, se criou em Marau, empreendendo no ramo da construção civil. Até então, Canela era um destino de férias e passeios muito frequentado na década de 1990, com a esposa Selaine e os filhos Luis Fernando e Luis Augusto.


Apesar de se identificar muito com a cidade, percebia a falta de opções de lazer, principalmente no centro. Foi então que um amigo da serra sugeriu algumas oportunidades em Canela e, em 1995, resolveu empreender seu primeiro prédio na cidade, no condomínio Quinta da Serra.


Após um período de ausência na região e trabalhando exclusivamente em Marau, a Novalternativa, empresa de Bassani, retornou a Canela em 2013, realizando a edificação de um prédio em frente à praça. Rapidamente, através da relação com os empresários locais, Fernando Bassani percebeu que havia demanda para unir seus projetos com o desenvolvimento de atrativos turísticos que revivessem a área central da cidade, principalmente o espaço da antiga Estação de Trem, que estava em licitação.


2016


Nasce o Projeto da Estação


Vencendo a licitação, a Incorporadora Novalternativa buscou a assessoria da família Urbani, que sabia tudo sobre locomotivas e, através de pesquisas sobre estilo arquitetônico nas famosas estações de trem de Londres, sob a coordenação da engenheira Giane de Lima, desenvolveu o projeto da Estação Campos de Canella, com o objetivo de preservar as características arquitetônicas do patrimônio histórico, devolvendo a vida ao centro da cidade e ao entorno da velha estação, com espaços de cultura e entretenimento, um centro de gastronomia, cervejaria, restaurantes, cave de vinhos e quiosques com produtos locais.



2017


A velha locomotiva é levada para reforma

Em novembro de 2017, a locomotiva belga La Meuse, fabricada em 1904, que passara mais de cinquenta anos parada na estação, sofrendo a ação do tempo e a depredação, foi retirada e levada para restauro. O parque temático Mundo a Vapor acolheu a proposta feita pela Novalternativa e assumiu a recuperação do trem, com o intuito de devolver a Canela esse importante patrimônio, perfeitamente restaurado.


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2018


A volta da locomotiva


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Durante um ano, as obras na estação ganharam um ritmo frenético para esperar a volta de sua estrela maior e, finalmente, em 6 de novembro de 2018, a Locomotiva La Meuse, completamente restaurada e pronta para funcionar, fez sua entrada triunfal na cidade, subindo a serra de Taquara a Canela, desta vez não sobre trilhos, mas carregada majestosamente em um caminhão aberto, pronta para ser içada e colocada de volta em seu posto de honra, como antigamente.


Foi um retorno festivo que iniciou em frente ao parque Mundo a Vapor, com a locomotiva escoltada por banda marcial durante todo o percurso e, novamente, como nos velhos tempos, uma multidão de canelenses reuniu-se na estação só para ver a chegada do trem.


A volta da locomotiva novinha em folha emocionou a todos e, como acontecia antigamente, muitas pessoas voltaram à estação para esperar a chegada do trem.


A cerimônia que marcou a volta da locomotiva emocionou muitas pessoas. Carmen Seibt, que já ocupou vários cargos políticos de relevância na cidade, recordou seus tempos de menina:


“[...] quando o trem apitava longe, em direção Gramado-Canela, tirava meus tamanquinhos e corria de pé descalço, e corria por duas quadras até onde o trem passava e ficava acenando. E por muitos anos, enquanto existiu o trem eu fazia isso, sempre a mesma coisa. Devia ter uns 8 ou 9 anos e era apaixonada por ver o trem passar e a vontade que eu tinha de andar de trem. O maquinista já sabia e fazia o trem apitar várias vezes e acenavam para mim.
[...] lembro de alguns passageiros que acenavam com um lencinho branco e era tão lindo [...] e eu voltava bem devagar pensando como seria bom estar dentro daquele trem.”

No dia em que a locomotiva foi devolvida à estação, Carmen voltou à infância acompanhando sua chegada.


A reforma da locomotiva

Antonio Carlos Teixeira de Souza Junior talvez seja hoje uma das pessoas que mais sabe sobre os antigos trens do Rio Grande do Sul. Não que tenha alguma graduação superior sobre o tema, mas graças à paixão que desenvolveu pelo assunto, tendo nascido em uma família onde os homens viviam em função dos trens.


Filho e neto de ferroviários, as locomotivas de verdade sempre foram seus brinquedos favoritos. Um dos avós era o maquinista Alfredo Emilio Ferrari, que fazia a linha Taquara-Porto Alegre. O outro avô, Lullo Soares de Souza, foi agente, telegrafista e chefe de estação. O pai, de quem herdou o nome, trabalhava em Porto Alegre e morava na estação Ildefonso Pinto, que existiu até 1971, na esquina da Avenida Borges de Medeiros com Mauá, no prédio da V.F.R.G.S.


Nascido em 1961, quando os trens ainda funcionavam, Junior, como é conhecido, conviveu com as locomotivas mesmo depois que as linhas férreas foram desativadas e as máquinas ficaram muito tempo paradas em Taquara.


Por essa razão, quando a Novalternativa ganhou a concorrência para reativar a estação de Canela, o pessoal do Mundo a Vapor chamou Junior e propôs um grande desafio: reformar a velha locomotiva que jazia carcomida pelo tempo e pelo descaso há mais de cinquenta anos.


Por sua vez, Junior, que tinha acompanhado ao lado do avô os mínimos detalhes das réplicas em miniatura que construíam juntos para aplacar a saudade das aventuras que a família viveu nos alegres tempos do trem, conhecia em detalhes não só as peças, como os segredos de seu funcionamento. Mas, para recuperar a locomotiva, precisavam de alguém que tivesse o maquinário e a mão de obra necessária. Foi então que procuraram Márcio Roberto Krummenauer, empresário da MKR Máquinas de Taquara, e juntos conseguiram empreender a nobre missão.


A Locomotiva da Estação


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A locomotiva La Meuse, classe 0-6-0, que hoje é um ícone da história de Canela, foi fabricada na Bélgica no início do século passado. Pesa 21 toneladas e precisava de 810 kg de carvão e 2.500 litros de água para funcionar. Esteve em serviço por muitos anos na linha Carlos Barbosa-Alfredo Chaves e era utilizada para fazer manobras.


Antes de voltar para a nova estação Campos de Canella, precisou passar por um grande processo de renovação realizado por uma grande equipe envolvendo a Novalternativa, o Mundo a Vapor, a MKR Máquinas e Antonio Carlos Teixeira de Souza Junior, que conhecia os dados técnicos da locomotiva e deu assistência ao trabalho.


Segundo o restaurador Márcio Krummenauer, da MKR, o trabalho foi cuidadoso nos mínimos detalhes, e toda a parte mecânica está funcional; só não mexeram na caldeira, mas, se ela fosse substituída, a locomotiva poderia voltar a andar.


Largo Benito Urbani


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O antigo espaço chamado Largo da Fama, criado na década de 1980, quando a cidade recebia a Festa Nacional do Disco, juntamente com diversos artistas de renome nacional, passou a ser chamado Largo Benito Urbani. O espaço é uma imensa calçada em frente à Estação Campos de Canella.


Urbani faleceu em março de 2017, deixando um legado de empreendedorismo. Assim, o novo espaço passa a homenagear Benito Antonio Urbani, empresário canelense, fundador do Parque Temático Mundo a Vapor e com grande envolvimento na história ferroviária de Canela, além de ter prestado diversos serviços comunitários em nossa cidade.


2019


INAUGURA A ESTAÇÃO CAMPOS DE CANELLA


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Dia 30 de janeiro de 2019 foi um dia muito especial para Canela. Quase tão especial quanto fora o 14 de agosto de 1924.


A diferença é que os trens já não circulam mais no Rio Grande do Sul; o século mudou e o milênio também. No intervalo de tempo entre as duas datas, a Estação parou e muitas outras coisas surgiram e desapareceram. Muitas pessoas vieram e outras tantas se foram. A vida é assim mesmo, uma viagem que passa rápido, evoluindo sempre.


Mas a novidade é que, 95 anos depois que João Corrêa inaugurou sua querida estação com tanto sacrifício, depois de ela ter ficado esquecida por 56 anos, eis que ressurge novamente, palpitante, reunindo moradores, turistas e comerciantes com o mesmo alegre burburinho do passado.


João Corrêa fez o trem chegar até Canela; os irmãos Urbani, com a arte que aprenderam de seu pai Ernesto, através do Mundo a Vapor, mantiveram o trem andando nos trilhos do tempo para que todos pudessem conhecer sua história. E, finalmente agora, os Bassani da Novalternativa, outra família de homens empreendedores, reviveram a Estação para o turismo e para o lazer dos canelenses.


A Nova Estação

A Estação Campos de Canella foi inaugurada em 30 janeiro de 2019 com a locomotiva a vapor La Meuse totalmente restaurada, com dois vagões primorosamente revitalizados e dezenas de espaços para gastronomia, entretenimento e comércio.


Uma Grande Inauguração

Para a grande inauguração, nove palcos foram montados e cantores, músicos e bailarinos encenaram a história da cidade a partir da chegada da linha férrea, mostrando o empreendedorismo e o esforço desses homens em prol do desenvolvimento da sua região.


Preservação do Patrimônio

Com a revitalização do espaço, Canela não ganhou apenas uma nova Estação. Ocupando uma área de 5,9 mil metros quadrados, a Novalternativa construiu também um paradouro turístico, comercial e residencial, incrementando a movimentação do centro da cidade.


Para Fernando Bassani, diretor da Incorporadora que realizou o projeto, a chegada das marcas locais confirma a inserção da Estação junto à comunidade e ao comércio da região:

“São importantes empresas da Serra Gaúcha que acreditam no potencial do projeto e que reforçam a ideia de que a Estação, além de preservar o patrimônio histórico-cultural da cidade, trouxe novas perspectivas turísticas e de negócios para Canela.”

2020


O Vírus que Parou o Mundo

Em janeiro de 2020, o setor do turismo estava preparado para viver um grande e promissor ano. Mas não foi o que aconteceu.


A pandemia do covid-19 deixou cidades desertas, esvaziou hotéis, obrigou companhias aéreas a cancelar rotas e impediu que navios de cruzeiro desembarcassem passageiros. As perdas no setor foram estimadas em bilhões de dólares. O turismo, que promove um constante fluxo de pessoas pelo globo, gerando oportunidades de negócio tanto para grandes conglomerados quanto para pequenos empreendimentos, sejam agências de viagem, pousadas, restaurantes ou guias turísticos que atuam em suas comunidades, parou sem data certa para sua retomada e recuperação. O vírus obrigou as pessoas a se isolarem, e, se não fosse a tecnologia avançada da informática e dos meios de comunicação, a catástrofe poderia ser ainda pior.


Só uma coisa não foi afetada: a natureza, que, além de ter se mantido saudável e pujante como sempre foi, independente da doença dos seres humanos, representou para Canela uma tábua de salvação. O turismo se cercou de todos os protocolos impostos pela pandemia e, assim como antigamente era indicada pelos médicos para a cura de doenças pulmonares, Canela foi o local privilegiado onde, em meio à natureza saudável, as pessoas puderam tirar suas máscaras e respirar.


A Rua Coberta


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A Estação Campos de Canella rapidamente virou um ponto turístico de convivência e lazer da cidade. O projeto que revitalizou a antiga estação férrea também criou a Rua Coberta de Canela, incrementando o local com atividades culturais, um parque de diversões e um completo centro gastronômico e comercial com lojas, restaurantes e quiosques, ligando duas importantes ruas do centro da cidade.


A Cúpula da Estação


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No centro do complexo, unindo a Estação com a Rua Coberta, foi construída uma gigantesca cúpula de ferro coberta com 630 peças de vidro, nos mesmos moldes das estações de trem da Europa, que além de promover a integração dos ambientes servirá para abrigar palco, espetáculos e eventos que resgatarão a memória da antiga estação de trem e da história de Canela.




Fernando Bassani, diretor da Novalternativa, afirma:

“Trabalhamos dentro de avançados conceitos de urbanismo e paisagismo totalmente alinhados com a estética da cidade de Canela e preparados para funcionar em todas as estações do ano. Tudo foi pensado de forma muito integrada, um projeto com fôlego de futuro, como há muito tempo a cidade espera”

Espaço de Convivência


A Estação atingiu seus objetivos com grande êxito e trouxe experiências que permitem projetar o crescimento em tempo inferior à expectativa inicial. Bassani avalia:

"Desde a sua concepção, ela foi pensada como complexo de convivência, ou seja, um espaço em que as pessoas apreciem passar o tempo. Assim, a constante agenda de atrações, em sua grande maioria realizadas por canelenses, tem promovido a ocupação do espaço pela comunidade, transformando-se em local de grande interação social"

A estação de trem de Canela está novamente apinhada de gente de todas as idades. Por toda parte se ouvem risos, música e pessoas conversando alegremente. É um ir e vir de turistas de diferentes lugares e com diferentes destinos. Só que, desta vez, nenhum trem vai chegar nem partir. Agora, a locomotiva novinha em folha descansa sobre os trilhos, contando aos visitantes suas aventuras e as histórias de antigamente.


Os antigos trabalhadores da viação férrea foram substituídos por empresários, garçons, cozinheiros, artistas e vendedores — centenas de pessoas que, direta ou indiretamente, voltaram a trabalhar na Estação.


Os bares e restaurantes da nova Estação Campos de Canella tematizaram a vida em torno do trem em sua decoração e em seus cardápios.


O sucesso do negócio também pode ser atribuído ao cuidado comercial na seleção de marcas. O espaço, outrora abandonado, ressurgiu como nova oportunidade para pequenos empreendedores locais, que ganharam a chance de se estabelecer no coração da cidade.

 
 
 

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